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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

A Menina que odiava Boleros

Ícones inesquecíveis dos anos 60

Os aniversários da priminha eram sempre um suplício para a jovem de 15 anos, afinal boleros e outros ritmos daquela época, tocados em profusão e repetidos por várias vezes na vitrola da tia, açoitavam seus ouvidos que só queriam saber de Beatles, Rolling Stones, Marmalade, Bee Gees ou qualquer outra banda que embalavam os dias e noites das turminhas adolescentes dos anos sessenta.  A menina tinha vontade de gritar "Socorro, tirem-me daqui urgente!"

Quem aguentava ouvir Besame Mucho ou Perfídia, boleros consagrados na década de 40 e que reinavam soberanos no Brasil numa época em que a galerinha só queria saber do garoto que amava os Beatles e Rolling Stones e foi pra guerra lutar?  A guerra mesmo, ninguém queria fazer ou saber qual era, a que estava acontecendo lá num país de nome estranho, quase exótico, Vietnam.

A tia atacava na festa da filhotinha de 3 anos, de Altemar Dutra, Agnaldo Timóteo, sambistas e Ângela Maria que em plena festinha entoava Gente Humilde, instigando os adultos a pensar com lágrimas nos olhos ou, quando muito, para levantar os ânimos, virava o disco e entrava com Babaluuu. Bem, aí melhorava um pouquinho, porque jovem adora imitar agudos e Ângela Maria era a rainha no gênero.

Enquanto a "sapoti" rodava na vitrola, a tia servia desde cachorros-quentes a um salgadinho no espeto, com cenoura, cebola, azeitona e salsicha de nome cochichado entre as mulheres porque era considerado um palavrão - sacanagem - era esse o nome do espetinho e a jovem não entendia por quê era assim conhecido, tampouco gostava daquele petisco. O que ela gostava mesmo era de bebericar, lá na cozinha da tia, longe dos olhos dos pais, um drink moderninho intitulado Cuba Libre ou a batida branquinha, feita com cachaça e leite condensado, apelidada pelos cariocas de Calcinha de Nylon. Ui, aquilo era uma tremenda infração que um adolescente poderia cometer naqueles idos! Valia a pena arriscar, era muito gostoso.

Naqueles tempos as festas infantis eram feitas nas casas dos pais. Doces e salgados preparados pela mãe com ajuda de uma irmã ou alguém da família, e os convidados eram, na maioria adultos. As crianças faziam gracinhas pra lá e pra cá e não existia essa coisa boa de animadores para entreter a garotada ou musiquinha infantil, isso só começou  na década de 80 junto com Xuxa e outros 'xatos' similares.
Os adolescentes tinham que ouvir o que os adultos gostavam e não era nada fácil, principalmente porque as músicas soavam enfadonhas e ultrapassadas aos dias revolucionários e aos anos rebeldes que começavam a acontecer pelo mundo. A festa só ficava um pouquinho melhor, quando ouviam Sérgio Endrigo ou qualquer outra música italiana. Rita Pavone então, era um alívio total! E estes, os adultos já gostavam também.

A jovem, espertinha, sempre levava consigo alguns disquinhos, daqueles que tinham música de um lado e do outro, duas apenas, e era uma troca rápida, meio escondido, quando acabava uma daquelas músicas de adulto.  Num ou outro intervalo musical, sem que ninguém percebesse, ela corria até a vitrola e colocava seus compactos, eram assim chamados aqueles disquinhos. Mas, logo vinha um tiozão ou tiazona que mudava o esquema e voltavam os boleros a rodar nas noites mornas do aniversário da priminha em pleno janeiro.

O mundo girava lá fora, uma revolução cultural e espacial estava acontecendo, Yuri Gagarin confirmava pra todo mundo que a terra era azul, ideias de liberdade em muitos sentidos afloravam no mundo ocidental pós guerra,  e sentia-se a pressão disso aqui também no Brasil, e o único jeito de dar voz aos jovens era através da música e do novo estilo de dançar e se vestir.

A jovem sentia tudo isso borbulhando dentro dela.  Ao redor poucos pareciam perceber o que ela e mais alguns sabiam que estava por vir. Encaminhou-se para a vitrola da tia, enquanto todos conversavam animadamente, e junto com a música, bem alto, gritou: "Help, I need somebody!  Help, not just anybody
Help, you know I need someone, help!"




Para entender melhor a importância do Rock nos anos 60 e esta Revolução Cultural, leia tudo neste link.

Aqui a música que serviu de inspiração para o conto acima.







17 comentários:

Maria Célia disse...

Oi Beth
Que beleza de conto, muito legal, me identifiquei com você.
Esta música de Marmalade, Reflections of my life é linda, gosto até hoje.
Uma beleza.
Beijo.

Palavras Vagabundas disse...

Beth,
amei! Eu fui em muitas festas assim, quem ainda se lembra do Sergio Endrigo?
Era um tempo bem ingênuo, mas que saudades.
bjs
Jussara

chica disse...

Adorei o conto,Beth e retrataste muito bem tudo o que acontecia.. Lindo!! Deves escrever mais contos, adorei!! beijos praianos,chica

Cristina Pavani disse...

Beth, você me fez lembrar uma batida que ficou famosa por aqui, no final da década de 70.
"Atrás da moita" era composta por pinga, leite condensado e groselha. Somente molhávamos o bico, um copinho de café merecia durar meia hora!
E a discoteca corria solta...

Heloísa Sérvulo da Cunha disse...

Beth,
Adorei essas reminiscências. Mostram bem aquela época romântica.
E a música inspiradora é linda.
Beijo.

ONG ALERTA disse...

Épocas da vida....
Beijo Lisette.

Regina Rozenbaum disse...

UAU que riqueza. Depois sou euzinha que escrevo bem?! Ah tá! Que conta um conto aumenta um ponto. Vc Bethita os multiplicou em memórias lindas e tão rica em detalhes...nossa, viajei lá pra casa de mamis onde,sendo a caçulinha de seis filhas, achava graça nesses preparativos e aguardava ansiosa a hora da festa. Os preparativos eram assim mesmo, tudo feito em casa! E que delícia. Sôdade pouca é bobagem.
Beijuuss identificados n.a.

Lu Souza Brito disse...

Bethinha, gostei muito do conto!

Engraçado, por ser algumas decadas antes do meu nascimento, leio como se estivesse fazendo uma 'volta ao passado'.
Lembrei-me de um livro que li ainda criança e chamava 'Amor e Cubra Libre', que peguei escondido da minha irmã.

Pior que as gerações atuais nem podem dizer que nós (a turma na faixa dos 30) é que ouviamos musicas ruins.
Hoje eles ouvem Arrocha, funk, os 'sertanejos universitários', kkkk.
É preciso sempre renovar. Tudo muda o tempo todo no mundo, já dizia Lulu Santos, mas nos gostos musicais, a coisa vai de mal a pior.
Um beijo

Calu Barros disse...

Agora, acabei de sair deste fantástico túnel do tempo que vc nos remeteu, Betinha.
Aaaamei o conto que bem pode ser fato real, os destaques da época, os sentires dos jovens, toda aquela ebulição. Iuupi,"era um(a)garoto(a) que como eu, amava os Beatles e os Rolling Stones...
Lindo fim de semana, amiga e, conte mais, muito mais, viu?
Bjos,
Calu

Márcia Cobar disse...

OI Betinha!
Que delicadeza de conto... Imaginei você toda entediada ouvindo as músicas dos tios... Com seu disco colorido na mão, seu passaporte mágico para a alegria, à espera do momento certo para fazer seu próprio mundo girar na vitrola...
Eu sou pós-xuxa e cresci com Ilariê... Como eu não tive outra infância, não tenho parâmetro de comparação. Mas quando comparo com a infância da criançada hoje em dia, vejo que tive muita sorte de nascer naqueles tempos...
Bjim
Márcia

Anne Lieri disse...

Ai,deu saudade!...rss...como eu gostava dessa musica e seu relato me tocou profundamente tb!Bjs,

Maria Luiza disse...

Beth, perfeito, mais que perfeito! Essa época foi marcante e me orgulho de tê-la vivido. Minha filha mais velha vive dizendo que ela queria muito ter nascido naquela época. Eu adorava os Beatles e sabia de cor todas as músicas e ainda hoje elas me emocionam. Adorei, adorei,adorei e por isso lhe abraço com muito carinho! Beijos!

Lúcia Soares disse...

Beth, me vi de volta ao passado! Era assim mesmo que as festas aconteciam, mais aconchegantes, menos deslumbrantes como as de hoje, mas com conteúdo familiar, calor, amizade.
Você está me saindo uma ótima contadora de casos, está bom demais!
Comi muito o salgadinho "sacanagem" e tinha tb o enroladinho de salame, preso por um palito e mergulhado num molho picante, com vinagre, limão, pimenta, escapou-me o nome, agora!
Recordar é viver.
Beijo!

Maria Izabel Viegas disse...

Bethinhamiga linda,
vim correndo mal abri o FB!!!! rs
Sabia que seria excelente e que me traria lembranças assim como as suas.
Bem, sou mis velha que vc e peguei o início da Bossa Nova já na escola Normal. Era uma delícia, nosso grupo amigo reunido no Grêmio da ENCD, o Frederico ao violão e nós, a cantar todas as músicas.
Mas antes, aos onze anos era esse suplício. Ah.... que nostalgia ver o "Meu Mundo Caiu" quando o meu mundinho estva com olhos lá no bem longe!Aquelas músicas lacrimosas, terrríveis para quem queria "sacudir" a vida, quem queria sair daquela prisão de mulheres tristes e homens traídos. Deus Dos Céus!!! E chegou a Alegria!!!!!E o twist, dançavamos em grupos, em festas nas casas de amigas , supervisionadas pelos pais. Como era bom!
Eu era apaixonada por rock and roll; Elvis era meu amado, meu primeiro namorado.
Não amava muito os Beatles mas era louca pelos Rolling Stones. Acho que era aquele cabelinho doos meninos. Eu gostava mais dos irreverentes.
Ninguém na família( tios e primos mais velhos)entendiam como aquela menina tão tímida e estudiosa gostava "daquelas coisas loucas". Minha mãe me levava aos Festivais de rock, um 'cão fila' rs ninguém chegava perto de mim. mas eu tinha que ver aquele povo cantando.
Ahhhh, minha linda, que bom ler vc hoje, agora de manhãzinha.
AMEI!!!!!!
Aliás, o que vc faz que eu não gosto?
Tudo teu é lindo, pleno de luz!
Que bom que nós não deixamos nosso mundo cair. Ninguém nos levantou. Nós crescemos e superamos tudo com aquela energia com a qual nascemos!
Beijos, minha carioca bela e amiga!

R. R. Barcellos disse...

E o Trio Irakitan? Ed Lincoln? E The Mamas and The Papas?
E o Leite de Onça, e o Samba, com Crush?
E o bambolê?

Eita, nóis!

Beijos.

ML disse...

Querida, adoro rock'n roll, mas no meu I pod "tem de um tudo",fado inclusive - ADORO!
Besame mucho tb adoro, mas só bolerão tô fora! Salta uma cuba libre, pls! ; > )))(e Dad que não me 'ouça" : > )

bjnhs

Nina disse...

rs, acho que mts se identificarao com o conto.
pensei que fosse a jovem Beth. Mas acho tbm que tinha um pouco dela aí, ne?